segunda-feira, 27 de julho de 2009

Juntar as peças

A auxiliar da sala do M. disse-me que na sexta-feira estava a dar água aos meninos e que o M. lhe pediu:
- Ti, áua! [Tina, água!]
Ela diz que até olhou para a educadora, para ver se ela também tinha percebido, e que a educadora fez-lhe um gesto a mostrar que sim.

É notório que o M. se esforça mais fora de casa. No colégio, com os avós ou com desconhecidos. Então com desconhecidos, é vê-lo a dizer dezenas de 'olás' e até mesmo 'andas' ('ana', na linguagem dele, acompanhado da mão a fazer o gesto).

Nunca o ouvi a pedir água. Pega na garrafinha e bebe; ou aponta para a garrafa/copo e emite uns grunhidos impacientes ou diz 'dá'; ou pega no copo, sobe a uma cadeira e tenta pegar no recipiente da água para enchê-lo (não consegue, que o recipiente é pesado, por isso... grunhe :S).

Perguntei à auxiliar se o M. costuma chamar por ela ('Ti') e ela diz que sim. Cá por casa, quando quer alguma coisa, muitas vezes diz 'ati', o que eu pensava ser o nome dele, do tipo 'dá ao ati'). Agora estou na dúvida, será que o que ele está a dizer não é o nome dele, mas sim o nome da auxiliar? Do género, 'quero a Ti', ou então pensa que 'Ti' é qualquer coisa que significa o mesmo que 'dá'? Só dúvidas... Hoje vou tentar falar melhor com ela sobre isso.

No fim-de-semana, o M. foi à cozinha, pegou numa banana e disse 'nana', ao mesmo tempo que a trazia para eu lha dar. E, ao mostrar-lhe um cartão dum jogo do Noddy, que tinha uma maçã, ele repetiu o meu 'maçã' com um 'çã' ou 'açã', som que nunca o tinha ouvido dizer. Serão coincidências? O certo é que estes momentos são tão escassos... E ainda há aquilo que não percebo bem se disse ou não, como me parecer que já disse borboleta, sapato, casaco e dói-dói, tudo na liguagem dele, claro. Mas é tudo tão incipiente... Tento ficar feliz com estes pequenos avanços, mas a preocupação leva a melhor.

Ontem, estava a brincar com ele, com um jogo que tem um tabuleiro e uma peças magnéticas em forma de carros. Digo-lhe sempre 'pó-pó', mas, para variar qualquer coisinha, comecei a dizer-lhe 'pó-pó azul', 'pó-pó vermelho' e assim por diante. Ele acena com a cabeça, a dizer que sim, mas não sei ao certo com que intenção o faz. Colocámos três carros azuis juntos e disse-lhe que eram todos azuis. E ele apontou e disse 'zu'. Depois, para meu espanto, olha para o meu pijama e aponta para uma lua azul e ri-se, depois aponta para um urso azul. Não pode ser coincidência, pois não?

Noto no M. um crescente (ou será apenas mais notório) problema com níveis de frustração. Não sei se é por não falar que tem esse problema, ou se é por causa desse problema que não fala. O certo é que é capaz de se ocupar por bastante tempo a fazer alguma coisa que lhe corra bem. Mas, se não consegue, como quando falha em colocar uma peça num puzzle, desiste e vai logo fazer outra coisa qualquer. Por vezes, até puxa o cabelo ou belisca-se. Nada de mais, mas é evidente. Se calhar noto mais agora, porque começou a fazer mais puzzles, desde que os pus mais à mão. Os que são para a idade dele ou mesmo alguns para três anos, até lhe correm muito bem. Mas se vai buscar puzzles mais complexos ou se não consegue encaixar uma peça, desanima. Não se isola, geralmente vai buscar outra coisa qualquer para brincar connosco ou ao nosso lado. Acho que nas crianças pequenas é normal esta frustração, mas como aqui o caso está um bocadinho mais complicado, a preocupação também aumenta.

Quando me lembro da M., na idade dele, era o mesmo ou pior. Ainda hoje, se for a ver, a M. tem a mania que tem de ser a melhor e não lida bem com a frustração. (Será que alguém lida?) Quando era pequena, nem pegava em puzzles. Só muito tarde consegui que sossegasse e mostrasse interesse em que lhe contasse histórias. Andava sempre de um lado para o outro, sempre foi muito 'física'. Pedalava no triciclo como ninguém, mas não ligava à TV nem aos peluches nem aos jogos, pouco aos livros. Queria andar sempre aos saltos e era (é) um despacho.

Acordava e não chamava por ninguém. Berrava. E só se calava com o biberão na boca. Era difícil vesti-la e penteá-la, tal a energia. No colégio, disseram sempre que não era hiperactiva, apenas com muita vida. Hoje, confirma-se. E que brincava muito sozinha (provavelmente por fazê-lo em casa), mas também brincava com os outros (basicamente com os maiores, até fugia para a sala dos grandes). Insistiam nisto, que ela brincava muito sozinha, mas também acompanhada. E eu, ainda pouco informada destas coisas comportamentais, perguntava-me 'mas por que raio insistem em dizer que também brinca acompanhada, qual era o problema se brincasse sozinha?'. Juro que na altura não percebia. Para mim, uma criança pequena brincar sozinha parece-me tão normal. Porque, como diz o pediatra, antes dos dois anos, o conceito de socialização delas ainda é rudimentar. E, claro, como ela era cheia de vida, não me passava pela cabeça que pudesse ter algum problema (a não ser a infindável energia).

...

Com tanta dispersão por parte do otorrino, na consulta esqueci-me de falar com ele sobre o mais importante. Sobre a interpretação do exame auditivo, que ainda não fizemos. Basicamente, só tínhamos falado ao telefone sobre isso. Queria saber até que ponto é que aquele exame nos pode dar alguma indicação sobre o nível de audição do M. antes da cirurgia. E queria também preceber por que é que supostamente o restabelecimento da audição é imediato com a cirurgia, e afinal depois venho a descobrir que não é bem assim. Que o exame só deve ser feito pelo menos um mês depois da cirurgia para que os resultados sejam fiáveis. É contraditório e gostava de perceber a lógica. Por isso, vou ter de fazer um sacrifício e acompanhar o meu marido, na quinta-feira, quando for ao otorrino tirar o (último) silicone que ainda tem no nariz. Vou levar o relatório do exame e ver se consigo retirar do médico alguma informação objectiva sobre o assunto, que é isso que pretendo dele, e não aventuras noutros campos da medicina (acho que ele deve ser um Indiana Jones reprimido :P).

4 comentários:

Charilas disse...

Sabes que eu acho tudo o que descreves do M. normalissimo para os seus 2 anos...Acho é que a tua visão e confiança já estão de tal forma abalados que te consome...

A frustração é normal, o facto de desistirem perante as adversidades é normal, afinal a concentração deles é tão limitada nestas idades. Acho que deves valorizar tudo o que ele já adquiriu. Acho extrordinário ele fazer puzzles...eu tenho mais 30 anos que o M. e detesto, portanto um puzzle para 2/3 anos seria para mim uma total aventura e era bem capaz de o "mandar às urtigas" e me ir entreter com outra coisa a que achasse mais piada. :0)

Contínua a estimular, a puxar por ele, e a valorizar tudo o que já faz tão bem e acima de tudo...não te martirizes.

Beijo grande

Luz de Estrelas disse...

Já sabes o que penso. Ia pedir-te que não o analisasses tanto, mas sei que é um processo normal que só cessará quando o ouvires de um especialista.

Flor de Leite disse...

Charilas: Estão abaladas, estão... LOL para a tua horripilância em relação a puzzles! Eu até gosto, desde que não tenham 15467 peças todas da mesma cor!

Luz: Tento não andar sempre a analisá-lo, mas em certos (muitos) momentos acaba por ser inevitável. Até tenho medo da ideia de ir a um especialista, e, sinceramente, não sei se vou ficar mais tranquila. A minha tranquilidade virá com os progressos do M., de certo. :)

Miragem disse...

A minha ouve perfeitamente bem e não está tão desenvolvida como o M.... Também ando preocupada, mas tento respeitar o seu ritmo...

Beijos nossos