segunda-feira, 8 de março de 2010

Tem pouco mais

de seis anos e meio, a menina. Entrou para o primeiro ano do primeiro ciclo do Ensino Básico (não era tão mais fácil dizer apenas 'primeira classe'?) em Setembro do ano passado. Devido às vicissitudes da vida, acabou por ir para outra escola que não aquela que estava 'programada'. Tudo novo. Escola nova, professora nova, auxiliares novas, colegas novos. Novos significa desconhecidos. Penso que o facto de ser ao lado de casa facilitou muito.

Como sempre, travou logo amizade com os rapazes. Acho que os escolheu pelo desenho das mochilas. Um tinha uma do Homem-Aranha, outro uma dos Cars. Sempre adepta de super-heróis e coisas sobre rodas, ganhou dois amigos instantâneos. Hoje em dia, é 'professora' de um deles, uma vez que a professora os distribuiu pelas carteiras, aos pares, sendo um 'melhor' do que o outro, para que o primeiro auxilie o segundo quando necessário.

Na reunião pós primeiro período, a professora descreveu-a como sendo muito respeitadora e trabalhadora. Disse que a turma no geral é boa, mas que ela é excelente. Que mesmo quando os bons alunos precisam de um empurrão, ela consegue lá chegar sozinha. Segundo ela, é a filha que qualquer pai gostaria de ter e pensa muitas vezes na sorte que teve ao calhar na turma dela.

Por ironia do destino (tendo em conta as suspeitas que tivemos em relação ao irmão), a escola para a qual teria ido e que acabou por não ir é a única da região que integra uma unidade de ensino a crianças com autismo. Continuando com a ironia, na escola onde está tem na sala uma menina com surdez, que precisa de NEE. Descreve-a da seguinte forma: 'Ela não ouve como nós, mas faz tudo bem e depressa'. Acho que as turmas com crianças com NEE deviam ser a regra, assumindo que houvesse condições para o efeito, e não a excepção, o 'vamos lá porque tem de ser'.

Nos intervalos, joga sempre futebol. Quer treinar muito para ser boa jogadora e guarda-redes. A professora diz que lhe acha um piadão, porque apesar de ser muito dedicada na sala de aula, chega ao recreio e é logo a primeira a pôr todos a jogar futebol. É um despacho, sempre foi.

Na escola aprenderam 19 letras, mas já lê tudo. Palavras complicadíssimas, livros inteiros. De vez em quando, aparece alguma dificuldade, mas esclarece a dúvida e segue. Lê com rapidez e autocorrige-se quando pronuncia mal uma palavra. É curiosa, persistente, teimosa, perfeccionista.

Relembro-lhe, mas nem era preciso, que a vida não pode ser só estudar, também é muito importante brincar. Ela diz que já sabe e é verdade. Faz os trabalhos de casa bem e depressa, regra geral, e depois vai treinar mais com a bola de casa ou vai ver desenhos animados enquanto os imita saltando no sofá até ficar transpirada. Aí, alguém ralha com ela porque também não é preciso tanto. Provavelmente, segue em direcção ao quadro de brincar, pega no giz e faz exercícios de Língua Portuguesa ou de Matemática. Nós somos os alunos. Ela é exigente e nós acabamos por ficar aborrecidos e dispersamos, pelo que continua sozinha ou vai brincar com o irmão. É quase certo que coloca a sua fralda de pano às costas, tipo capa, e a fralda de pano do irmão nas costas dele, também tipo capa, e fingem que são super-heróis.

Acredita que a fada dos dentes levou os quatro dentes que já caíram e deixou ficar moedas em troca, e que o Pai Natal existe e sabe tudo. Continua muito zangada com o rei mau que matou Jesus, e faz tudo para poder ajudar o senhor padre na missa das crianças. Adora comer e até dorme bem, mas é mais por interesse uma vez que já sabe que tem de dormir muito para ser grande e forte.

É a minha filha.